O PERIGO DE ESTARMOS DESATENTOS NA DEMOCRACIA
O problema inerente a escândalos enormes como o Petrolão é o
de gerar expectativas positivas de que a crise será resolvida com a punição
exemplar dos culpados.
Até poderia ser, em outro país mais sério, com uma classe
política menos debochada, com um povo mais fiscalizador e intolerante com os
excessos. Digamos Suécia, Estados Unidos, Holanda, Inglaterra, Alemanha e
outros de mesmo quilate e cultura política.
Deveria ser uma vergonha para nós a frase usual de que “no
país tal, isto não seria possível...”; mas não é! Apresentamos certo nível de
torpor ético, de hipnose moral, e ficamos como que catalépticos, amortecidos e
sem ação. Paradoxalmente, o que nos outros países nos encanta e desperta a “boa”
inveja, aqui para nós é uma impossibilidade de tão difícil solução como ir
tomar o café da manhã em Marte.
Talvez seja por isso que nos deixamos contaminar pela chance
de que outras pessoas resolvam a questão para nós, e pela alegre esperança de
que tenhamos um dia de “Estados Unidos da América”. E a esperança não é insana,
pois se podemos ter frequentemente dias cubanos e bolivarianos, por que não
seria possível um dia com democracia plena? A questão é que nem esses dias de
esquerda senil e ensandecida são feito por nós... e sim pelos outros, os que
detêm o poder e possuem a firme convicção do que querem fazer, lado ao lado com
a certeza de que o povo brasileiro não reage de moto próprio. O povo não tem
motor de arranque! E eles sabem disso!
Mas voltemos ao tema inicial. A vida de uma nação, de um
povo, pode ser comparada a um jogo de xadrez, e, concomitantemente, segue os
preceitos básicos que regem o desafio mental da movimentação das peças. É deste
jogo que nasceu a máxima que a defesa é o melhor ataque. Isto é, a atenção ao
que se desenrola no tabuleiro é vital. Um
jogador desatento, fascinado pelo sucesso inexorável de seus próximos lances
pode de um momento para outro receber o xeque-mate. É justamente aí que reside
o perigo. Esquecer ou considerar vencido o adversário, como se este não tivesse
mais jogadas, na quase infindável quantidade de opções de um embate
enxadrístico.
Por mais seguras que estejam as coisas, por mais
indefensáveis que se apresentem, jamais se esqueça de que o outro também está
jogando, buscando se defender e levar o jogo a um resultado favorável a ele.
O adversário está fazendo de tudo – licitamente ou não –
para vencer o jogo, ou melhor, para não perder, pois é um jogo tão decisivo que
não haverá revanche, ganhe quem ganhar,
Ele sabe, mais do que ninguém, que seu caso é perdido em
condições normais de temperatura e pressão. Ganhar em seu caso depende de sua
capacidade de mudar as condições ambientes ou em destruir o tabuleiro, o que é a
especialidade deles. É mais factível realizar o segundo do que alcançar o
primeiro.
Se fizermos um rápido balanço de forças veremos que ele
dispõe de poderosos instrumentos que podem ser usados institucionalmente, como
organismos estatais aparelhados, consciências políticas compráveis, magistrados
parciais, dinheiro aos borbotões, falta de caráter e pendores comportamentais malévolos,
e outros que tais, a permitirem que ele alcance seus objetivos de bolivarização
do país antes que as causas judiciárias que lhe são adversas sejam julgadas.
Ele está pensando em mover as peças com rapidez tal que
impeça as jogadas da justiça tornando o país uma cubazuela, com todos os seus
desmandos e atentados contra as liberdades individuais, antes que outras forças
sejam chamadas a agir em caso de necessidade.
É claro que isto só pode acontecer em um Estado onde seus
constituintes – o povo – abra mão de sua soberania e de seu poder maior de
polícia, pois a lei nada mais é do que a vontade dele, como no Brasil. Isto não
acontece em país onde o povo sabe que o Estado lhe pertence, e que ele somente
delega a um mandatário a sua gerência e administração, cuidadosamente observada
por ele através das câmaras legislativas, a parte sua que analisa e julga se tudo
está correto, constitucionalissimamente falando, sendo possível repita-se,
entretanto, naqueles em que o presidente toma para si a soberania do povo
agindo absolutamente como um soberano majestático sem prestar contas de si a
ninguém e não sendo responsável pelos seus atos de mando.
Enfim, estamos falando da verdadeira diferença entre uma
democracia e uma não-democracia ao falar de conteúdo e não simplesmente de
forma. É o grande e inexorável hiato que separa o Brasil, de democracia
claudicante e insegura, e os Estados Unidos da América, em que jamais o
presidente achar-se-á dono do país.